segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

O Ecumenismo como missão para o século XXI

No âmbito da Conferência Universal das Missões Protestantes, organizada na cidade escocesa de Edimburgo, em 1910, considerada como um dos principais pontos de partida do ecumenismo moderno, um delegado de uma Igreja do Extremo Oriente proferiu as seguintes palavras:
“Enviaste-nos missionários que nos fizeram conhecer Jesus Cristo, e por isso vos estamos muitos gratos. Mas trouxeste-nos também as vossas distinções: uns prega-nos o metodismo, outros o luteranismo, o congregacionalismo ou o episcopalismo. Pedimos que nos pregueis simplesmente o Evangelho e deixai que seja o próprio Jesus Cristo a suscitar no seio dos nossos povos, pela ação do seu Espírito, a Igreja, conforme às suas exigências, conforme também ao génio da nossa etnia, que será a Igreja de Cristo na China, a Igreja de Cristo na Índia, liberta de todos os «ismos» que atribuis à pregação do Evangelho entre nós”.
Passado mais de um século, as palavras acima mencionadas não podiam ter maior pertinência.
Desde o início, a história do Cristianismo, modelada por seres humanos na busca de fidelidade a Deus, mas sempre também sujeitas a falhas e limitações, apresenta-se marcada por tensões e divisões, muitas delas com caráter duradouro.
O Evangelho de Jesus não é transmitido no mundo contemporâneo por cristãos que professam em comum o essencial da mesma fé, mas por cristãos divididos entre si, separados uns dos outros. Divergências na compreensão da fé, sobretudo conceções diferentes sobre a Igreja e a sua unidade, os sacramentos e os ministérios, continuam a impedir a realização de uma unidade visível.
A divisão dos cristãos contrasta com um dos princípios fundamentais da fé cristã, enunciado no Credo. Com efeito, a fé cristã professa, como elemento essencial da sua identidade, a unidade da Igreja de Jesus Cristo: “Creio na Igreja una, santa, católica e apostólica”. Com esta formulação do Credo, proclamada pelos Concílios de Niceia (325) e de Constantinopla (381), afirmam as principais Confissões cristãs que a sua fé no Deus Uno e Trino se traduz na realidade da Igreja, comunidade visível de crentes que procuram viver o Evangelho de Jesus ao longo dos tempos.
A realidade de divisão contrasta com a confissão de fé, interpelando os cristãos a uma atitude ecuménica na busca da unidade, tendo como como finalidade um testemunho mais autêntico e da mensagem salvífica e libertadora do Evangelho a favor da Humanidade.
A proclamação do Evangelho junto dos homens e das mulheres do nosso tempo só será eficaz se promovermos os laços de comunhão entre os cristãos das diversas confissões.
Seria, por exemplo, uma contradição querermos estar unidos a Jesus e, ao mesmo tempo, estarmos divididos entre nós, comportando-nos de uma forma individualista, indo cada um por sua conta, julgando-nos ou até excluindo-nos uns aos outros. É preciso, portanto, uma renovada conversão a Deus que nos quer unidos.
Um dos resultados mais frutuosos do ecumenismo ao longo do último século, não obstante as vicissitudes do processo ecuménico e a diversidade de conceções e práticas das diversas Igrejas, foi ter-se alcançado um consenso relevante sobre dois princípios fundamentais: a unidade cristã deve ser uma unidade visível; a unidade a concretizar deve ser uma unidade na diversidade, assente naquilo que é verdadeiramente necessário e suficiente.
Por um lado, existe a consciencialização nas principais Confissões cristãs de que a unidade á concretizar é uma unidade visível, baseada em elementos doutrinais e institucionais comuns,
e não somente uma unidade de cariz espiritual, interior e afetiva. A unidade cristã deve exprimir-se como comunhão da mesma fé, no reconhecimento mútuo dos ministérios e dos sacramentos, na celebração comum da eucaristia e no desenvolvimento do serviço fraterno que emana do Evangelho.
Como segundo aspeto relevante, enfatiza-se que a unidade a construir deve ser uma unidade na diversidade, cuja visibilidade não implicaria uma instituição eclesial única e centralizada, nem numa uniformidade de expressões e linguagem, mas num consenso sobre o conteúdo da fé, dos sacramentos, dos ministérios, do testemunho e do serviço comum. Consequentemente, deve ser uma unidade que salvaguarde e respeite a pluralidade em diversos registos e níveis.
O desenvolvimento e o aprofundamento do ecumenismo exige a prossecução dos seguintes desafios: 1) Consolidar a receção dos resultados do diálogo entre as Igrejas e os organismos ecuménicos, tanto no nível da informação quanto da circulação, como um processo de assimilação vital, urgente e necessária; 2) Organizar a vida das comunidades num verdadeiro espírito e método ecuménicos, na pastoral, na espiritualidade, na catequese, nas instituições e estruturas; 3) Promover o diálogo, a partir do respeito das recíprocas identidades e tradições; 4) buscar com sinceridade a reconciliação, demonstrando sincera abertura para compreender a teologia e a prática das Igrejas irmãs; 5) Investir em estruturas ecuménicas, a nível local, regional e nacional 6) Apostar na formação ecuménica, tanto dos ministros ordenados quanto das comunidades dos fiéis; 7) Clarificar os horizontes do diálogo, estabelecendo metas a serem alcançadas, sobretudo nos horizontes doutrinal, pastoral e espiritual.
O diálogo ecuménico nunca foi fácil, mas devemos ter em conta que o ecumenismo emana radicalmente da esperança cristã, que não se baseia na simples confiança nas capacidades humanas.
O ccumenismo aparece como um dom ligado ao agir salvífico de Deus, que quer construir uma nova Humanidade na verdade, na justiça, no amor e na paz, e como missão a cumprir pelos crentes.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Tudo o que sobe converge: a visão do Universo segundo Pierre Teilhard de Chardin

O grande espírito de Pierre Teilhard de Chardin nunca se contentou com o estudo de detalhes, particularidades e singularidades, que é a principal preocupação de uma grande parte dos pensadores da pós-modernidade ocidental.
Era um verdadeiro filósofo e o tinha seu olhar fixo no todo, e qualquer elemento particular era visto na perspectiva da totalidade. Como verdadeiro filósofo, era desafiado pelo problema do uno e do múltiplo.
Para Teilhard de Chardin, tudo no Universo está imerso na transcendência divina, que lhe confere o seu sentido por excelência.
No começo de tudo, está Deus como o ponto Alfa, como origem de todo ser, que fez o nosso Universo e o nosso planeta em particular literalmente explodir em formas cada vez mais perfeitas e complexas de vida.
E no termo de tudo, do seu movimento e de seu sentido, está Deus como o ponto Ómega; para o qual tudo tende.
Sendo Deus a unidade pura, deu aos seres a faculdade de participar de sua unidade, em si mesmos, e tenderem sempre para unidades mais amplas, pois todo o movimento de subida é um movimento de “convergência”, como exprime no seu aforismo: “Tudo o que sobe, converge”.
s átomos, que já são unidades de uma energia complexa, unem-se, permanecendo eles mesmos, na unidade de moléculas cada vez maiores. As moléculas subsistem permanecendo elas mesmas, mas de alguma forma transfiguradas na célula viva.
As células vivas se unem, de novo, e se especializam permanecendo elas mesmas em organismos cada vez mais diversificados.
O processo de complexificação não pára com o surigimento de seres humanos pensantes e reflexivos.
Teilhard dá grande destaque à socialização à escala planetária e global, considerando que o ser humano só o é perfeitamente quando chega aos limites de si mesmo e manifesta a solidariedade a todo humano, passado, presente e futuro.
Os sinais do desenvolvimento da socialização planetária estão presentes no desenvolvimento das comunicações, que tem vindo a acentuar-se desde o advento da Revolução Industrial.
As comunicações eletrónicas – telégrafo, telefone, rádio, televisão, e sobretudo a Internet que Teilhard não conheceu, mas em que viria uma confirmação de seus sonhos – permitem unir os cérebros de todos os seres humanos fazendo-os pensar e atuar em conjunto, como se fosse um supercérebro.
As informações em tempo real, fazem que milhões e milhões de pessoas participem das mesmas emoções, e interajam através dos continentes formando um só público, um enorme ser coletivo que
tendencialmente abarca a humanidade inteira.
Claro que o mal não está excluído desse processo. Contudo, para Teilhard de Chardin, um cristão convicto, a vitória final será do bem, e a humanidade socializada desvendará que o seu destino é a “amorização”.
A “amorização” consiste na expansão de amor que una definitivamente a Humanidade, formando uma unidade de ordem superior de espírito e de liberdade, formando a noosfera.
Como foi referido anteriormente, tudo no Universo parte de Deus e converge para Ele.
Então, para além dos patamares da biogénese e da noogénese, deve-se acrescentar a instância definitiva, a cristogénese.
Neste ponto, Teilhard de Chardin preconiza a sua conceção do Cristo cósmico, o centro supremo da consistência espiritual de todo o universo, presente como um elemento universal e encarnado por todo o Cosmo, orientando-o para o Pai: o qual é justamente o ponto Ômega, ao qual vai submeter-se e entregar o seu Reino.
A cristogénese é também um movimento de subida e de convergência, prenunciado pelas fases anteriores, mas que representa a realidade definitiva do Universo.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

A espiritualidade de Teilhard de Chardin: uma breve abordagem

Pierre Teilhard de Chardin, que nasceu em Orcines, em 1 de maio de 1881, e faleceu em Nova Iorque, em 10 de abril de1955, foi um padre jesuíta, teólogo, filósofo e paleontólogo francês que logrou construir uma visão integradora entre a ciência e a religião.
Disposto a desfazer o mal entendido entre a ciência e a religião, nem sempre foi devidamente compreendido pelos representantes de ambas. Muitos colegas cientistas negaram o valor científico de sua obra, acusando-a de vir carregada de um misticismo e de uma linguagem estranha à ciência. Do lado da Igreja Católica, por sua vez, foi proibido de lecionar, de publicar suas obras teológicas e submetido a um quase exílio na China.
Como cientista, Teilhard de Chardin estava familiarizado com as evidências geológicas e fósseis da evolução do planeta e da espécie humana.
Como cristão, tinha consciência da necessidade de um cristianismo renovado que contribuísse para a sobrevivência do planeta e o progresso da Humanidade.
Como outros cristãos de épocas anteriores, Teilhard reconheceu a premente necessidade de articular o cristianismo com a cultura e o espírito de seu próprio tempo.
Hoje, em face da ciência moderna, da tecnologia e de um mundo cada vez mais globalizado, essa necessidade é mais urgente do que nunca.
No cerne da sua reflexão, está a visão filosófica, teológica e mística a respeito da evolução de todo o Universo, do caos primordial até o despertar da consciência humana sobre a Terra, estágio esse que, segundo ele, será seguido por uma Noogénese, a integração de todo o pensamento humano numa única rede inteligente que acrescentará mais uma camada em volta da Terra: a Noosfera, que recobrirá todo a biosfera do planeta Terra. A orientar todo esse processo, existe uma força que age a partir de dentro da matéria, que orienta a evolução em direção a um ponto de convergência: o Ponto Ômega. Teilhard sustentava a ideia de um Panenteísmo cósmico: a crença de que Deus e o Universo mantém uma criativa e dinâmica relação de progressiva evolução.