domingo, 8 de setembro de 2013

Maria: uma visão para o nosso tempo

'Kissing the Face of God', by Morgan Weistling

No dia 8 de Setembro, o calendário litúrgico cristão assinala o nascimento de Maria, mãe de Jesus. Trata-se de uma oportunidade privilegiada para uma reflexão sobre o papel de Maria no Cristianismo contemporâneo..
A História ajuda-nos a compreender as diferenças entre as diversas confissões cristãs. Os caminhos da Igreja bifurcaram-se ao longo dos séculos e com ela a percepção sobre o papel de Maria . Nas Igrejas do Oriente, a devoção mariana começa no século III, enquanto no Ocidente torna-se algo mais relevante no século IV, mas foi a partir do século X que esta devoção teve uma expressão mais significativa na religiosidade popular e na liturgia. Mais tarde, com a Reforma Protestante, há uma ruptura com a veneração de Maria professada pela Igreja Católica Romana.
O Concílio Vaticano II, após um longo debate, optou por integrar um capítulo sobre o papel de Maria na Constituição Dogmática Lumen Gentium sobre a Igreja, criando condições para um diálogo ecuménico entre cristãos de diferentes confissões.
O documento conciliar fez vir à luz um rosto humano de Maria, revelando a Maria das Escrituras, a mulher de Nazaré que aceitou e testemunhou o chamamento de Deus. O papel de Maria foi posto no seu devido lugar, centrado no mistério de Cristo e da Igreja, intimamente unida a Cristo e a Igreja, ao mesmo tempo que muito próxima de Cristo, mas por outro lado unida a Igreja e como parte dela. 
O Concílio Vaticano II abriu um novo tempo no diálogo ecuménico, no qual a figura de Maria foi submetida a uma intensa releitura, com a recuperação do património de tradições teológicas e litúrgicas comuns.
Esse novo percurso tem sido enriquecido por estudos, diálogos, encontros locais e internacionais, com o envolvimento de cristãos de diversas confissões. 
De modo a abrir caminho para uma imagem de Maria adequado à realidade do século XXI, parecem importantes as seguintes linhas orientadoras: 
- Segundo o Novo Testamento, Maria constitui um ser plenamente humano e nada tem de um ser celeste. Maria é a mãe de Jesus. E não só. As Escrituras falam dos irmãos e das irmãs de Jesus. John P. Meier, possivelmente o maior especialista em exegese histórica dos evangelhos, escreve : "Se o historiador ou exegeta - deixando de lado a fé e a posterior doutrina da Igreja - for solicitado a emitir um julgamento sobre o Novo Testamento (...), encarados apenas como fontes históricas, a opinião (...) é que os irmãos de Jesus eram legítimos."Sendo mulher e mãe, ela manifesta a plena humanidade de Jesus, que não contradiz a fé de que a existência de Jesus se explica, em última instância, a partir de Deus. A este respeito, é importante referir que o próprio Joseph Ratzinger, o papa emérito  Bento XVI escreveu em 1969: "A filiação divina de Jesus não se baseia (...) no facto de Jesus não ter pai humano; a doutrina da divindade de Jesus não seria posta em causa se Jesus fosse o fruto de um casamento normal."
- Maria constitui um modelo de fé. As palavras de Maria no Novo Testamento revelam uma espiritualidade profunda e conservam na atualidade todo o sentido. Maria louva Deus que derrubou os poderosos e exaltou os humildes. O seu papel foi relevante na forma revolucionária como Jesus encarava as mulheres e o seu papel espiritual e social. Jesus foi um grande defensor da dignidade feminina, convidando inclusive mulheres para o seu círculo mais intimo de discipulos. Recorde-se o papel fundamental de Maria Madalena e de outras mulheres nas comunidades primitivas.
Maria, ou melhor, Myriam, uma mulher judia, que foi esposa e mãe, que sofreu por Jesus e com ele. Mas que nunca perdeu a esperança. Que conhecemos por causa de Jesus. Porque cada criança é um espelho da sua mãe. Partilhando em tudo a nossa condição humana, mas que contribuiu para transformar a História.