O ano que está a terminar marca o 95.º aniversário de um dos processo de transformação social e histórica mais significativos do século XX e da História da Humanidade em geral: a Revolução Russa.
Escrevi “Revolução Russa”, mas será mais correto falar de Revoluções Russas. Com efeito, houve duas revoluções russas: a revolução de fevereiro e a revolução de outubro.
No início de 1917, a Rússia, um dos principais países beligerantes na Primeira Guerra Mundial, era um verdadeiro vulcão em vias de explosão.
No domínio social, caraterizava-se por uma sociedade em que a nobreza e a Igreja Ortodoxa constituíam dois grupos sociais claramente privilegiados, que detinham a grande maioria das propriedades, num país de dimensões continentais em que cerca de 80% da população era constituída por camponeses que viviam em condições miseráveis e de verdadeira servidão, apesar de esta ter sido formalmente abolida pelo czar Alexandre II em 1861. O operariado industrial, que representava 2% da população vivenciava igualmente duras condições de vida. A burguesia russa não era muito numerosa e forte, o que contribuía para uma sociedade cada vez mais polarizada e desigual.
No domínio económico, predominava uma agricultura arcaica, tecnicamente atrasada e de baixo rendimento. A industrialização, intensificada no último quartel do século XIX, concentrava-se num reduzido número de cidades e empresas de grande dimensões, muitas delas dominadas por capitais estrangeiros.
Politicamente, vigorava o regime de monarquia absoluta e autocrática. O czar Nicolau II, que reinava desde 1881, assenta o seu poder numa corte corrupta e ostensiva, nas forças armadas e policiais e numa Igreja Ortodoxa alheia a todas as tentativas de renovação teológica, eclesial e espiritual.
Etnicamente, a Rússia czarista era uma prisão de povos. As numerosas nacionalidades não russas da Império achavam-se completamente privadas de direitos, submetidas continuamente a todo o género de ultrajes e humilhações. O regime czarista tinha ensinado a população russa a ver as nacionalidades não russas como etnias inferiores, às quais se dava o qualificativo oficial de gente "de outras raças", e inha inculcado o desprezo e o ódio em relação a elas. O regime alimentava conscientemente as discórdias nacionais, instigava uns povos contra os outros, organizava perseguições de judeus e massacres entre tártaros e arménios no Cáucaso.
Na sequência da derrota da Rússia na guerra com o Japão (1903-1905), as diversas forças políticas de oposição ao absolutismo czarista tentaram uma revolução, em 1905. Apesar da revolução ter sido violentamente reprimida, o czar Nicolau II, relutantemente, lançou o famoso Manifesto de outubro, que permitiu a criação de uma Duma (Parlamento) nacional e a existência de partidos políticos. Estas medidas surtiram escasso efeito, visto que os partidos eram sistematicamente vigiados e a Duma era controlada pela aristocracia e pelo czar, cujos poderes continuaram bastante amplos, fazendo dele o último monarca absoluto da Europa. Em 1914, a Rússia entrou em guerra como aliada da Entente contra as Potências Centrais (Alemanha, Império Austro-Hungáro e Império Otomano). A guerra agravou as dificuldades da população do vasto Império Russo em geral, agravando as suas precárias condições de vida. No plano militar, a Rússia foi derrotada pela Alemanha e pelos seus aliados com certa facilidade.
Em 23 de fevereiro de 1917, pelo calendário juliano, que se refere ao dia 8 de março no calendário gregoriano, uma série de reuniões e manifestações aconteceram em Petrogrado, por ocasião do Dia Internacional da Mulher. Nos dias que se seguiram, a agitação continuou a aumentar, recebendo a adesão das tropas encarregadas de manter a ordem pública, que se recusavam a atacar os manifestantes.
No dia 27 de fevereiro, uma multidão de soldados e trabalhadores com trapos vermelhos em suas roupas invadiu o Palácio Tauride, onde a Duma se reunia. Durante a tarde, formaram-se dois comités provisórios em salões diferentes do palácio. Um, formado por deputados moderados da Duma, que se tornaria o Governo Provisório. O outro era o Soviete de Petrogrado, formado por trabalhadores, soldados e militantes socialistas de várias correntes. Temendo uma repetição dos incidentes sangrentos de 1905, o grão-duque Mikhail ordenou que as tropas leais baseadas no Palácio de inverno não se opusessem à insurreição e se retirassem. Em 2 de março, cercado por amotinados, Nicolau II assinou sua abdicação.
Em face desta situação, a Duma proclamou a República, pondo fim à Monarquia imperial. Formou-se o Governo Provisório presidido pelo príncipe Georgy Lvov, um liberal, tendo o socialista Aleksandr Kerenski como um dos seus ministros mais proeminentes.
Era um governo interessado em manter a participação russa na Primeira Guerra Mundial e que pretendia fazer instaurar Rússia um regime político democrático e federal.
O Governo Provisório não conseguiu debelar a crise interna e ainda insiste na continuação da guerra contra a Alemanha, em 4 de maio, um novo governo Provisório é formado, agora por mencheviques e socialistas-revolucionários, sendo presidido por Aleexandr Kerenski.
A crise social e as derrotas na guerra contra a Alemanha provocam diversas sublevações, como as Jornadas de julho, que tiveram a participação dos marinheiros de Kronstadt. As insubordinações são controladas, porém é grande a pressão da população, é justamente depois desses incidentes, que Kerensky surge como principal dirigente do Governo Provisório e os socialistas reformistas chegam a obter maioria.
Nessa conjuntura, o derrube do Governo Provisório já estava certamente desenhado, Lenine, líder do Partido Bolchevique, com a ajuda secreta da Alemanha, entrou clandestinamente na Rússia, criando as condições para a organização de uma insurreição armada que tem seu ponto culminante no dia 25 de outubro de 1917, que marcou a Revolução Vermelha.
Nessa ação, merece destaque a constituição de um Comitê Militar Revolucionário sob a liderança de Trotsky formado por quarenta e oito bolcheviques, quatro anarquistas e quatorze socialistas revolucionários de esquerda, sendo responsável pela ação que toma o Palácio de inverno em Petrogrado, sede de Kerensky e do seu governo. Kerensky fugiu da Rússia. Os bolcheviques, largamente maioritários no Congresso Panrusso dos Sovietes, tomam o poder em 7 de novembro de 1917. É criado um Conselho dos Comissários do Povo, presidido por Lênine. Trotsky assume o Ministério dos Negócios Estrangeiros e Estaline o das Nacionalidades. .
Com o fim da Revolução Branca, que vislumbrava uma Rússia democrática, verificou-se o surgimento do primeiro regime comunista do mundo, que assumiu rapidamente um caráter totalitário, escravizando e exterminando milhões de pessoas sistematicamente durante várias décadas, até ao derradeiro colapso, em 1991. E esta mesma ditadura por fim, dividiu o mundo, originando a Guerra Fria.
No início de 1917, a Rússia, um dos principais países beligerantes na Primeira Guerra Mundial, era um verdadeiro vulcão em vias de explosão.
No domínio social, caraterizava-se por uma sociedade em que a nobreza e a Igreja Ortodoxa constituíam dois grupos sociais claramente privilegiados, que detinham a grande maioria das propriedades, num país de dimensões continentais em que cerca de 80% da população era constituída por camponeses que viviam em condições miseráveis e de verdadeira servidão, apesar de esta ter sido formalmente abolida pelo czar Alexandre II em 1861. O operariado industrial, que representava 2% da população vivenciava igualmente duras condições de vida. A burguesia russa não era muito numerosa e forte, o que contribuía para uma sociedade cada vez mais polarizada e desigual.
No domínio económico, predominava uma agricultura arcaica, tecnicamente atrasada e de baixo rendimento. A industrialização, intensificada no último quartel do século XIX, concentrava-se num reduzido número de cidades e empresas de grande dimensões, muitas delas dominadas por capitais estrangeiros.
Politicamente, vigorava o regime de monarquia absoluta e autocrática. O czar Nicolau II, que reinava desde 1881, assenta o seu poder numa corte corrupta e ostensiva, nas forças armadas e policiais e numa Igreja Ortodoxa alheia a todas as tentativas de renovação teológica, eclesial e espiritual.
Etnicamente, a Rússia czarista era uma prisão de povos. As numerosas nacionalidades não russas da Império achavam-se completamente privadas de direitos, submetidas continuamente a todo o género de ultrajes e humilhações. O regime czarista tinha ensinado a população russa a ver as nacionalidades não russas como etnias inferiores, às quais se dava o qualificativo oficial de gente "de outras raças", e inha inculcado o desprezo e o ódio em relação a elas. O regime alimentava conscientemente as discórdias nacionais, instigava uns povos contra os outros, organizava perseguições de judeus e massacres entre tártaros e arménios no Cáucaso.
Na sequência da derrota da Rússia na guerra com o Japão (1903-1905), as diversas forças políticas de oposição ao absolutismo czarista tentaram uma revolução, em 1905. Apesar da revolução ter sido violentamente reprimida, o czar Nicolau II, relutantemente, lançou o famoso Manifesto de outubro, que permitiu a criação de uma Duma (Parlamento) nacional e a existência de partidos políticos. Estas medidas surtiram escasso efeito, visto que os partidos eram sistematicamente vigiados e a Duma era controlada pela aristocracia e pelo czar, cujos poderes continuaram bastante amplos, fazendo dele o último monarca absoluto da Europa. Em 1914, a Rússia entrou em guerra como aliada da Entente contra as Potências Centrais (Alemanha, Império Austro-Hungáro e Império Otomano). A guerra agravou as dificuldades da população do vasto Império Russo em geral, agravando as suas precárias condições de vida. No plano militar, a Rússia foi derrotada pela Alemanha e pelos seus aliados com certa facilidade.
Em 23 de fevereiro de 1917, pelo calendário juliano, que se refere ao dia 8 de março no calendário gregoriano, uma série de reuniões e manifestações aconteceram em Petrogrado, por ocasião do Dia Internacional da Mulher. Nos dias que se seguiram, a agitação continuou a aumentar, recebendo a adesão das tropas encarregadas de manter a ordem pública, que se recusavam a atacar os manifestantes.
No dia 27 de fevereiro, uma multidão de soldados e trabalhadores com trapos vermelhos em suas roupas invadiu o Palácio Tauride, onde a Duma se reunia. Durante a tarde, formaram-se dois comités provisórios em salões diferentes do palácio. Um, formado por deputados moderados da Duma, que se tornaria o Governo Provisório. O outro era o Soviete de Petrogrado, formado por trabalhadores, soldados e militantes socialistas de várias correntes. Temendo uma repetição dos incidentes sangrentos de 1905, o grão-duque Mikhail ordenou que as tropas leais baseadas no Palácio de inverno não se opusessem à insurreição e se retirassem. Em 2 de março, cercado por amotinados, Nicolau II assinou sua abdicação.
Em face desta situação, a Duma proclamou a República, pondo fim à Monarquia imperial. Formou-se o Governo Provisório presidido pelo príncipe Georgy Lvov, um liberal, tendo o socialista Aleksandr Kerenski como um dos seus ministros mais proeminentes.
Era um governo interessado em manter a participação russa na Primeira Guerra Mundial e que pretendia fazer instaurar Rússia um regime político democrático e federal.
O Governo Provisório não conseguiu debelar a crise interna e ainda insiste na continuação da guerra contra a Alemanha, em 4 de maio, um novo governo Provisório é formado, agora por mencheviques e socialistas-revolucionários, sendo presidido por Aleexandr Kerenski.
A crise social e as derrotas na guerra contra a Alemanha provocam diversas sublevações, como as Jornadas de julho, que tiveram a participação dos marinheiros de Kronstadt. As insubordinações são controladas, porém é grande a pressão da população, é justamente depois desses incidentes, que Kerensky surge como principal dirigente do Governo Provisório e os socialistas reformistas chegam a obter maioria.
Nessa conjuntura, o derrube do Governo Provisório já estava certamente desenhado, Lenine, líder do Partido Bolchevique, com a ajuda secreta da Alemanha, entrou clandestinamente na Rússia, criando as condições para a organização de uma insurreição armada que tem seu ponto culminante no dia 25 de outubro de 1917, que marcou a Revolução Vermelha.
Nessa ação, merece destaque a constituição de um Comitê Militar Revolucionário sob a liderança de Trotsky formado por quarenta e oito bolcheviques, quatro anarquistas e quatorze socialistas revolucionários de esquerda, sendo responsável pela ação que toma o Palácio de inverno em Petrogrado, sede de Kerensky e do seu governo. Kerensky fugiu da Rússia. Os bolcheviques, largamente maioritários no Congresso Panrusso dos Sovietes, tomam o poder em 7 de novembro de 1917. É criado um Conselho dos Comissários do Povo, presidido por Lênine. Trotsky assume o Ministério dos Negócios Estrangeiros e Estaline o das Nacionalidades. .
Com o fim da Revolução Branca, que vislumbrava uma Rússia democrática, verificou-se o surgimento do primeiro regime comunista do mundo, que assumiu rapidamente um caráter totalitário, escravizando e exterminando milhões de pessoas sistematicamente durante várias décadas, até ao derradeiro colapso, em 1991. E esta mesma ditadura por fim, dividiu o mundo, originando a Guerra Fria.