Existem três maneiras de analisar racionalmente a doutrina da Trindade. as correntes ortodoxa, latina e moderna.
A teologia ortodoxa oriental parte da unidade da natureza do Pai. O Pai é fonte e origem de toda a divindade. Ele profere a Palavra, que é o Filho. Ao proferir a Palavra lhe sai simultaneamente o Sopro, que é o Espírito Santo. Os três recebem do Pai toda a natureza divina, por isso são consubstanciais.
A teologia latina, partilhada pela Igreja Católica Romana, pela Comunhão Anglicana e pelas principais Igrejas Protestantes partem da natureza divina, que é espiritual. O Espírito absoluto sem princípio e origem de tudo é o Pai. O Pai se conhece por sua Inteligência e gera o Filho. Pai e Filho se amam e juntos expiram o Espírito Santo. A mesma natureza se encontra nos três, por isso há um só Deus.
A teologia moderna parte das três Pessoas Juntas. Realça o facto de que as três estão sempre inter-relacionadas e em eterna comunhão (pericórese) .Esta relação é tão absoluta que os divinos Três se unificam sem se fundirem, sendo então um único Deus vivo.
Quando falamos do Pai, do Filho e do Espírito Santo, como três divinas Pessoas, a maioria dos cristãos entende a palavra pessoa no sentido corrente: um indivíduo que possui inteligência, vontade, sentimentos e pode dizer eu. Em Deus haveria três inteligências, três vontades, três consciências. Se dissermos somente isto, sem acrescentarmos que os Três
estão sempre relacionados, cairemos fatalmente no erro do triteísmo. Com isso queremos dizer que, na verdade, teríamos três deuses distintos.
Como resultado desta dificuldade da compreensão da doutrina da Trindade pelo pensamento moderno, houve dois teólogos, um protestante, Karl Barth, e outro católico, Karl Rahner, que tentaram substituir a palavra pessoa na linguagem trinitária. Ela criaria mais dificuldades do que ajudaria os cristãos de hoje para entender o mistério da comunhão divina.
Quando falamos de Deus simplesmente, fora da referência trinitária, diziam eles, podemos falar de pessoa. Caso contrário, pensaríamos que Deus significaria uma força cósmica impessoal. Deus seria então a Pessoa absoluta ou o Sujeito eterno.
Mas com referência à Santíssima Trindade sugeriam que se evitasse a palavra pessoa. No lugar dela, Karl Barth propõe que falássemos em três modos de ser. Trindade significaria, portanto, que a Pessoa eterna (Deus) realmente existe em três modos de ser, como Pai sem origem, como Filho sempre gerado do Pai e como Espírito Santo eternamente vindo do Pai e do Filho conjuntamente.
Karl Rahner aceitou esta mesma ideia, inserindo uma pequena modificação. Em vez de falar em três modos de ser, falou em três modos de subsistência. Esta modificação tenciona evitar o erro do modalismo. Segundo esta doutrina errónea, desenvolvida nos primeiros séculos do cristianismo, no fundo não se aceita a Santíssima Trindade, mas um só Deus se revelando em três maneiras distintas; seria somente para nós três; em si mesmo, Deus seria e continuaria sempre um. Karl Rahner diz que Deus é um mistério de comunhão. Está sempre saindo de si e se entregando em vida e amor É a autocomunicação
como mistério radical. Então: enquanto a autocomunicação, no próprio acto de se entregar permanece soberana e incompreensível, um princípio sem princípio se chama Pai; enquanto
esta autocomunicação se exprime e se faz compreensível e por isso é Verdade, se chama Filho; enquanto esta autocomunicação acolhe em Amor e cria União se chama o Espírito Santo. Este processo não é compreendido somente por nós, mas revela Deus assim como é em si mesmo; evitamos o modalismo e estamos diante do mistério da comunhão que sempre
se realiza em três modalidades reais e nos insere dentro do mesmo processo fazendo que, como pessoas, sejamos mais e mais capazes de doação e de amor.
Embora no Novo Testamento não existe uma doutrina elaborada da Trindade, tal que foi proclamada nos Concílios Ecuménicos, nomeadamente no Concílio de Niceia (325) e de Constantinopla (381), existem fórmulas triádicas, Para nos ajudar a compreender a relação
do Pai, do Filho e do Espírito, a luz do Novo Testamento, não existe melhor texto do que
o testemunho de defesa de Santo Estevão perante o Sinédio judaico, relatado por Lucas nos Actos dos Apóstolos:
Durante o seu discurso, Estevão tem uma visão: “Mas este, cheio do Espírito Santo e de olhos fixos no Céu, viu a glória de Deus e Jesus de pé, à direita de Deus” (Act. 7, 55).
Estevão não vê Deus em três seres, nem um símbolo triangular, muitas vezes
associado à Trindade na arte cristã ocidental:
A visão de Estevão consiste no seguinte:
- O Espírito Santo está ao lado de Estevão, está nele próprio. O Espírito Santo é a força e o poder visíveis provenientes de Deus, inspirando Estevão.
- O próprio Deus fica escondido, somente a sua glória e o seu poder é que são manifestos.
_ Jesus está à direita de Deus, isto é, partilha o tono divino com o mesmo poder e glória. Como Filho de Deus ressuscitado e acolhido na vida eterna de Deus, é simultaneamente representante de Deus junto da Humanidade e representante da Humanidade junto de Deus.
Portanto, bom base na reflexão de Hans Küng e de outros pensadores cristãos, aos nossos contemporâneos, podemos apresentar ao doutrina da Trindade da seguinte forma:
- Crer em Deus Pai significa crer no Deus único que criou o Universo e ama todas as suas criaturas, nomeadamente a Humanidade;
- Crer em Deus Filho significa crer na revelação do Deus único na figura histórica de Jesus de Nazaré, que é a Palavra, Imagem e Filho de Deus;
- Crer em Deus Espírito Santo significa crer na presença poderosa e santificadora de Deus e na sua acção sobre os seres humanos e o Universo em geral.
Em suma, a Trindade, numa explicação adequada à nossa contemporaneidade, deve ser compreendida como a forma infinitamente amorosa como Deus agiu e se revelou através de Jesus através da dádiva do Espírito Santo, de modo a promover a salvação universal e integral da Humanidade.
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