sábado, 21 de julho de 2012

Rio+20: repensar o nosso futuro comum


A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, mais conhecida como Rio+20, decorreu entre os dias 13 e 22 de junho de 2012 na cidade brasileira do Rio de Janeiro, cuja finalidade era consolidar o compromisso político global em prol do desenvolvimento sustentável .
Tratou-se de mais uma das cimeiras das Nações Unidas sobre os as questões globais cada vez prementes do ambiente e do desenvolvimento. A primeira teve lugar em Estocolmo, em 1972. Depois no Rio de Janeiro, em 1992. Em Joanesburgo, em 2002. E agora, como indicou o título, de regresso ao Rio de Janeiro.
Da primeira Cimeira do Rio em 1992, última, resultaram a chamada "Agenda 21" e as "Convenções das Alterações Climáticas, da Biodiversidade e de Combate à Desertificação". Todas estas iniciativas foram um prelúdio para diversos desenvolvimentos significativos, que daí surgiram, nomeadamente o Protocolo de Quioto. Em 2002, decorreu em Joanesburgo a Cimeira da Terra embora com resultados mais modestos.
Concluída a Cimeira Rio+20, ficou um sentimento geral de deceção com os resultados obtidos, nomeadamente com o documento aprovado pelos Estados participantes, intitulado “O Futuro que Queremos”.
As organizações não governamentais não deixaram de manifestar a sua posição crítica relativamente ao resultado atingido, que se limita a uma declaração não vinculativa, sem que tenham sido assumidos compromissos ambiciosos ou definidas ações práticas. Só por si este documento não irá desenvolver as transformações económicas, sociais, políticas e ambientais necessárias para a promoção do desenvolvimento sustentável, cabendo a cada um de nós, cidadãos do planeta Terra, uma atuação sustentável com rumo ao futuro que queremos.
O insucesso da Cimeira Rio+20 pode ter diversas leituras. Neste texto, proponho uma leitura que procura relacionar a crise global do ambiente com a crise dos grandes conceitos estratégicos da civilização moderna, nomeadamente o conceito de progresso.
Infelizmente, esquecemos com demasiada frequência que muitas das grandes ruínas existentes nos desertos e nas florestas do nosso planeta são monumentos às armadilhas de um desenvolvimento ecológica e humanamente insustentável, as lápides funerárias de civilizações que caíram vítimas do seu próprio sucesso. No destino destas sociedades, outrora prósperas, sofisticadas e brilhantes, encontramos ensinamentos valiosos para a nossa contemporaneidade.
O desenvolvimento acelerado da população mundial, da economia e da tecnologia durante os séculos XIX e XX e a primeira década do século XXI colocaram sobre o nosso planeta um fardo que pode ser perigoso para o futuro da Humanidade. 
Atualmente, estamos em via de promover alterações climáticas profundas e irreversíveis. A biodiversidade é cada vez mais limitada, o que enfraquece a capacidade de suporte para a nossa própria existência duradoura e sustentável, como civilização humana. O aumento da riqueza não foi acompanhado pela correção das injustiças sociais. Antes pelo contrário. Nunca como no nosso tempo existiu um tão grande desigualdade entre pobres e ricos, mesmo dentro das sociedades mais desenvolvidas, o que fragiliza a solidez da democracia, uma das grandes conquistas civilizacionais da Humanidade.
Atualmente, o nosso conhecimento da história planetária, extraordinariamente ampliado nas últimas décadas, dá-nos uma imagem frágil do nosso posicionamento no Cosmos. As investigações realizadas demostram a existência de ciclos climáticos dominados pelo predomínio de diversas idades glaciares, alternados por períodos mais amenos de duração muito mais breve.
Existem alguns autores chegam mesmo a sugerir que a Humanidade, tal como a conhecemos hoje, aproveitou  uma breve janela de oportunidade associada ao último período interglaciar. Tratar-se-ia de um “longo verão”, que permitiu em poucos milénios promover o nascimento da agricultura e as sucessivas revoluções tecnológicas e culturais, que conduziram às presentes estruturas das sociedades contemporâneas.
Perante esta situação, temos a responsabilidade ética de fazer do nosso pequeno planeta Terra um mundo cujas criaturas não sejam atormentadas pela guerra, torturadas pela pobreza e e pelo medo, divididas pela absurda separação de etnias, de cores e de ideologias.
Devemos ter a coragem e a lucidez de promovermos esta missão, a fim de que nos filhos e os filhos de nossos filhos possam orgulhar-se da sua condição de seres humanos.
Para reflexão, junto um documento de uma organização cristã mundial, a Cáritas Internacional, sobre o desenvolvimento sustentável do nosso planeta.


O FUTURO NA PERSPETIVA DA CARITAS:
TODOS COM FOME DE JUSTIÇA, EQUIDADE, SUSTENTABILIDADE ECOLÓGICA E CORRESPONSABILIDADE!


O mundo atravessa há alguns anos uma crise sem precedentes com resultados dramáticos: maior desigualdade, exclusão, violência, a exacerbação dos conflitos, migração forçada, o empobrecimento um número crescente de pessoas e o escândalo de 1000 milhões de pessoas passarem fome.
A Cáritas Internacional, confederação mundial de 164 organizações católicas de solidariedade, reafirma a seu conceito de desenvolvimento humano integral solidário, entendido como um conceito abrangente que tem em conta a interdependência da família humana e o seu bem-estar nas suas diferentes dimensões: económica, social, política, cultural, ecológica e espiritual.
Exigimos uma mudança de paradigma, uma nova civilização que coloque a dignidade e bem-estar de homens e mulheres no centro de toda ação. Os compromissos assumidos na Cimeira do Rio + 20 devem contribuir para validar esta perspetiva.
“Sem verdade, sem confiança e amor pelo que é verdadeiro, não há consciência e responsabilidade social, e a atividade social acaba à mercê de interesses privados e lógicas de poder, com efeitos desagregadores na sociedade, sobretudo numa sociedade em vias de globalização que atravessa momentos difíceis como os atuais.” (CiV 5).
No caminho para esta mudança, no qual esperamos que a Cimeira Rio+20 seja um marco, existem cinco elementos/dimensões que são fundamentais:
1) UM FUTURO SEM FOME
Apelamos aos líderes para que tornem a luta contra a fome uma prioridade e garantam o direito à alimentação. A alimentação é a base para desenvolver as nossas capacidades e talentos. Se, como está expresso no documento zero, 1/6 da população mundial é subnutrida (75% deles são pequenos agricultores), então estes não podem contribuir plenamente para o bem-estar das suas comunidades e das suas famílias. Desperdiçar recursos importantes essenciais para a saúde do nosso planeta.
2) UM FUTURO COM VISÃO
Apelamos aos líderes para que mantenham a visão dos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) e os seus compromissos na sua implementação. Os ODM representam um roteiro para o desenvolvimento sustentável e para um mundo mais justo. É essencial que, dentro de um novo quadro, estes objetivos incluam não só os compromissos assumidos pelos países desenvolvidos como também a promoção de um modelo de desenvolvimento a favor do bem-estar de toda a humanidade, do primado da justiça, da equidade, da sustentabilidade ecológica e responsabilidade.
3) UM FUTURO NO QUAL CUIDAMOS DA NOSSA CASA: A CRIAÇÃO
Apelamos à capacidade transformadora de todos os seres humanos para que utilizem com o máximo cuidado a Criação e que incentivem ativamente projetos, ideias e ações de conservação do meio-ambiente. Os ambientes da nossa vida, sejam rurais ou urbanos, devem permitir uma vida digna e saudável e devem ser ecologicamente sustentáveis. A exploração dos recursos naturais instalou-se, domina e expande-se. O ambiente como “recurso” ameaça o ambiente como 'casa'.
4) UM FUTURO COM UMA NOVA ECONOMIA VERDE
A Cáritas apoia a ideia de uma economia verde desde que assente nos princípios éticos da equidade e da solidariedade. Apelamos a que a construção de uma visão da "economia verde" não substituía ou deixe de fora as propostas do conceito de "desenvolvimento humano, integral e sustentável", construídas durante décadas.
Existe uma verdadeira preocupação, por parte das organizações, que o novo conceito de "economia verde" seja centrado num modelo de mercado e que venha fortalecer os princípios neoliberais de crescimento e que tenha como consequência a gestão privada do mercado da sustentabilidade, o aumento dos preços, uma privatização inimaginável de bens comuns (água, oceanos, florestas) e planos de ajustamento estrutural ambientais.
5) UM FUTURO COM UM NOVO CONTRATO SOCIAL
Propomos um modelo económico que tenha presente a democracia participativa e que promova a dignidade humana, o desenvolvimento humano sustentável e a distribuição de riqueza. Apelamos a todas as pessoas de boa vontade para que contribuam para uma cultura de respeito e diálogo e que fomente o acesso aos direitos e à justiça. È necessário definir um novo contrato social que tenha em conta a nossa interdependência e que nos impele a agir como cidadãos com responsabilidade pelo bem comum. Somos todos consumidores dos produtos da criação e, como indivíduos responsáveis, temos a possibilidade de escolher formas de vida que promovem o desenvolvimento, que respeitam o ambiente e que contribuem para reduzir os efeitos negativos nas populações mais pobres.

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