O discurso de Martin Luther King, Jr., foi pronunciado na escadaria do Monumento ao presidente Abraham Lincoln, em Washington, D.C., tendo sido escutado por mais de 250.000 pessoas, reunidas na capital dos Estados Unidos da América, no âmbito da "Marcha para Washington por Emprego e Liberdade".
A marcha foi um grande manifestação em prol da defesa da igualdade de direitos entre os todos os cidadãos, independentemente da sua cor da pele, exigindo igualmente das instituições políticas federais um compromisso mais firme no reconhecimento desses mesmos direitos, sobretudo nos Estados do sul, onde os afro-americanos eram considerados como pessoas de seguida categoria.
A marcha foi realizada num contexto particularmente tenso.Havia muita ansiedade, medo e esperança também. Ansiedade, porque os manifestantes não sabiam se iam conseguir chegar a Washington e sair de lá. Medo, porque muitos dos manifestantes tiveram de atravessar fronteiras de Estados que defendiam claramente a segregação e a discriminação. Washington, D.C. estava virtualmente em estado de sítio. O Governo Federal tinha receio de distúrbios. Pela primeira vez desde a abolição da Lei Seca em 1933, foram fechados todos os estabelecimentos de bebidas alcoólicas. As forças policiais tinham turnos de 18 horas. O Exército foi mobilizado.
E, apesar de tudo isto, nasceu um movimento magnífico de pessoas de diversas
etnias, condições sociais e confissões religiosas, que se juntaram pacificamente, que se inspiraram umas às outras, que proclamaram juntas a dignidade fundamental da pessoa humana.
A marcha teve consequências duradouras. Em 1964, o Congresso dos Estados aprovou a Lei dos Direitos Civis, e no ano seguinte, a Lei sobre o Direito de Voto, consagrando a igualdade de direitos civis e políticos.
A marcha teve consequências duradouras. Em 1964, o Congresso dos Estados aprovou a Lei dos Direitos Civis, e no ano seguinte, a Lei sobre o Direito de Voto, consagrando a igualdade de direitos civis e políticos.
Em 1964, Martin Luther King, Jr. foi galardoado com o Prémio Nobel da Paz.
Discurso “I Have a Dream”
Há
cem anos, um grande americano, sob cuja sombra simbólica nos encontramos,
assinava a Proclamação da Emancipação. Esse decreto fundamental foi como um
raio de luz de esperança para milhões de escravos negros que tinham sido
marcados a ferro nas chamas de uma vergonhosa injustiça. Veio como uma aurora
feliz para terminar a longa noite do cativeiro. Mas, cem anos mais tarde, devemos
enfrentar a realidade trágica de que o Negro ainda não é livre.
Cem
anos mais tarde, a vida do Negro é ainda lamentavelmente dilacerada pelas
algemas da segregação e pelas correntes da discriminação. Cem anos mais tarde,
o Negro continua a viver numa ilha isolada de pobreza, no meio de um vasto
oceano de prosperidade material. Cem anos mais tarde, o Negro ainda definha nas
margens da sociedade americana, estando exilado na sua própria terra.
Por
isso, encontramo-nos aqui hoje para dramaticamente mostrarmos esta
extraordinária condição. Num certo sentido, viemos à capital do nosso país para
descontar um cheque. Quando os arquitectos da nossa república escreveram as
magníficas palavras da Constituição e da Declaração de independência, estavam a
assinar uma promissória de que cada cidadão americano se tornaria herdeiro.
Este
documento era uma promessa de que todos os homens veriam garantidos os direitos
inalienáveis à vida, à liberdade e à procura da felicidade. É óbvio que a
América ainda hoje não pagou tal promissória no que concerne aos seus cidadãos
de cor. Em vez de honrar este compromisso sagrado, a América deu ao Negro um
cheque sem cobertura; um cheque que foi devolvido com a seguinte inscrição:
"saldo insuficiente". Porém nós recusamo-nos a aceitar a ideia de que
o banco da justiça esteja falido. Recusamo-nos a acreditar que não existam recursos suficientes nos grandes cofres de oportunidades deste país.
Por
isso viemos aqui cobrar este cheque - um cheque que nos dará quando o
recebermos as riquezas da liberdade e a segurança da justiça. Também viemos a
este lugar sagrado para lembrar à América da clara urgência do agora. Não é o
momento de se dedicar à luxuria do adiamento, nem para se tomar a pílula
tranquilizante do gradualismo. Agora é tempo de tornar reais as promessas da
Democracia. Agora é o tempo de sairmos do vale escuro e desolado da segregação
para o iluminado caminho da justiça racial. Agora é tempo de abrir as portas da
oportunidade para todos os filhos de Deus. Agora é tempo para retirar o nosso
país das areias movediças da injustiça racial para a rocha sólida da
fraternidade.
Seria
fatal para a nação não levar a sério a urgência do momento e subestimar a
determinação do Negro. Este sufocante verão do legítimo descontentamento do
Negro não passará até que chegue o revigorante Outono da liberdade e igualdade.
1963 não é um fim, mas um começo. Aqueles que crêem que o Negro precisava só de
desabafar, e que a partir de agora ficará sossegado, irão acordar
sobressaltados se o País regressar à sua vida de sempre. Não haverá
tranquilidade nem descanso na América até que o Negro tenha garantido todos os
seus direitos de cidadania.
Os
turbilhões da revolta continuarão a sacudir as fundações do nosso País até que
desponte o luminoso dia da justiça. Existe algo, porém, que devo dizer ao meu
povo que se encontra no caloroso limiar que conduz ao palácio da justiça. No
percurso de ganharmos o nosso legítimo lugar não devemos ser culpados de actos
errados. Não tentemos satisfazer a sede de liberdade bebendo da taça da
amargura e do ódio.
Temos
de conduzir a nossa luta sempre no nível elevado da dignidade e disciplina. Não
devemos deixar que o nosso protesto realizado de uma forma criativa degenere na
violência física. Teremos de nos erguer uma e outra vez às alturas majestosas
para enfrentar a força física com a força da consciência.
Esta
maravilhosa nova militância que engolfou a comunidade negra não nos deve levar
a desconfiar de todas as pessoas brancas, pois muitos dos nossos irmãos
brancos, como é claro pela sua presença aqui, hoje, estão conscientes de que os
seus destinos estão ligados ao nosso destino, e que sua liberdade está
intrinsecamente ligada à nossa liberdade.
Não
podemos caminhar sozinhos. À medida que caminhamos, devemos assumir o
compromisso de marcharmos em frente. Não podemos retroceder. Há quem pergunte
aos defensores dos direitos civis: "Quando é que ficarão
satisfeitos?" Não estaremos satisfeitos enquanto o Negro for vítima dos
incontáveis horrores da brutalidade policial. Não poderemos estar
satisfeitos enquanto os nossos corpos, cansados das fadigas da viagem, não
conseguirem ter acesso a um lugar de descanso nos motéis das estradas e nos
hotéis das cidades. Não poderemos estar satisfeitos enquanto a mobilidade
fundamental do Negro for passar de um gueto pequeno para um maior. Nunca
poderemos estar satisfeitos enquanto um Negro no Mississipi não pode votar e um
Negro em Nova Iorque achar que não há nada pelo qual valha a pena votar. Não,
não, não estamos satisfeitos, e só ficaremos satisfeitos quando a justiça
correr como a água e a rectidão como uma poderosa corrente.
Sei
muito bem que alguns de vocês chegaram aqui após muitas dificuldades e
tribulações. Alguns de vocês saíram recentemente de pequenas celas de prisão.
Alguns de vocês vieram de áreas onde a vossa procura da liberdade vos deixou
marcas provocadas pelas tempestades da perseguição e sofrimentos provocados
pelos ventos da brutalidade policial. Vocês são veteranos do sofrimento
criativo. Continuem a trabalhar com a fé de que um sofrimento injusto é
redentor.
Voltem
para o Mississipi, voltem para o Alabama, voltem para a Carolina do Sul, voltem
para a Geórgia, voltem para a Luisiana, voltem para as bairros de lata e para
os guetos das nossas modernas cidades, sabendo que, de alguma forma, esta
situação pode e será alterada. Não nos embrenhemos no vale do desespero.
Digo-lhes,
hoje, meus amigos, que apesar das dificuldades e frustrações do momento, ainda
tenho um sonho. É um sonho profundamente enraizado no sonho americano.
Tenho
um sonho que um dia esta nação levantar-se-á e viverá o verdadeiro significado
da sua crença: "Consideramos estas verdades como evidentes por si mesmas,
que todos os homens são criados iguais".
Tenho
um sonho que um dia nas montanhas rubras da Geórgia os filhos de antigos
escravos e os filhos de antigos proprietários de escravos poderão sentar-se à
mesa da fraternidade.
Tenho
um sonho que um dia o estado do Mississipi, um estado deserto, sufocado pelo
calor da injustiça e da opressão, será transformado num oásis de liberdade e
justiça.
Tenho
um sonho que meus quatro pequenos filhos viverão um dia numa nação onde não
serão julgados pela cor da sua pele, mas pela qualidade do seu caractér.
Tenho
um sonho, hoje.
Tenho
um sonho que um dia o estado de Alabama, cujos lábios do governador
actualmente pronunciam palavras de ... e recusa, seja transformado numa
condição onde pequenos rapazes negros, e raparigas negras, possam dar-se
as mãos com outros pequenos rapazes brancos, e raparigas brancas, caminhando
juntos, lado a lado, como irmãos e irmãs.
Tenho
um sonho, hoje.
Tenho
um sonho que um dia todo os vales serão elevados, todas as montanhas e encostas
serão niveladas, os lugares ásperos serão polidos, e os lugares tortuosos
serão endireitados, e a glória do Senhor será revelada, e todos os seres a
verão, conjuntamente.
Esta
é nossa esperança. Esta é a fé com a qual regresso ao Sul. Com esta fé seremos
capazes de retirar da montanha do desespero uma pedra de esperança. Com esta fé
poderemos transformar as dissonantes discórdias de nossa nação numa bonita e
harmoniosa sinfonia de fraternidade. Com esta fé poderemos trabalhar juntos,
rezar juntos, lutar juntos, ir para a prisão juntos, ficarmos juntos em posição
de sentido pela liberdade, sabendo que um dia seremos livres.
Esse
será o dia quando todos os filhos de Deus poderão cantar com um novo
significado: "O meu país é teu, doce terra de liberdade, de ti eu canto.
Terra onde morreram os meus pais, terra do orgulho dos peregrinos, que de cada
localidade ressoe a liberdade".
E se
a América quiser ser uma grande nação isto tem que se tornar realidade. Que a
liberdade ressoe então dos prodigiosos cabeços do Novo Hampshire. Que a
liberdade ressoe das poderosas montanhas de Nova Iorque. Que a liberdade ressoe
dos elevados Alleghenies da Pensilvania!
Que
a liberdade ressoe dos cumes cobertos de neve das montanhas Rochosas do
Colorado!
Que
a liberdade ressoe dos picos curvos da Califórnia!
Mas
não só isso; que a liberdade ressoe da Montanha de Pedra da Geórgia!
Que
a liberdade ressoe da Montanha Lookout do Tennessee!
Que
a liberdade ressoe de cada Montanha e de cada pequena elevação do Mississipi.
Que
de cada localidade, a liberdade ressoe.
Quando
permitirmos que a liberdade ressoe, quando a deixarmos ressoar de cada vila e
cada aldeia, de cada estado e de cada cidade, seremos capazes de apressar o dia
em que todos os filhos de Deus, negros e brancos, judeus e gentios,
protestantes e católicos, poderão dar-se as mãos e cantar as palavras da antiga
canção negra: "Liberdade finalmente! Liberdade finalmente! Louvado seja
Deus, Todo Poderoso, estamos livres, finalmente!"
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