A pessoa humana, analisando o Universo
de que é simplesmente uma partícula, observa que todas as coisas evoluem.
Observa a ação e a reação, o fluxo e o refluxo, a ordem e a entropia, a criação
e a destruição, o nascimento e a morte. Nada é permanente, tudo se transforma.
Progressivamente, foi compreendendo que essas coisas mutáveis são manifestações
da Realidade Última.
Desde os tempos mais remotos até aos
nossos dias, encontra-se nos diversos povos uma perceção desta Realidade Última
presente no curso dos acontecimentos cósmicos.
Perceção e conhecimento que impregnam
as vidas dos seres humanos de um profundo sentido espiritual.
Por sua vez, as religiões, a filosofia
e a ciência, ligadas ao progresso da cultura humana, procuram responder às
mesmas questões com noções mais apuradas e uma linguagem mais elaborada.
Os pensadores de todas as sociedades e
de todas as épocas, de diversas correntes filosóficas e religiosas,
compreenderam a necessidade de ser admitida a existência desta Realidade
Última. Os seres humanos deram a esta Realidade muitas denominações. Muitos designaram-na
sob o termo Deus ou Divindade (sob diversos títulos). Outros chamaram-na a
Eterna e Infinita Energia. Outros ainda deram-lhe simplesmente o nome de
Absoluto. Mas todos reconheceram a sua existência.
O Absoluto Divino, em si mesmo, é
incognoscível. O mistério intrínseco do Absoluto Divino está para além das possibilidades
cognitivas da pessoa humana. As diversas tradições religiosas e filosóficas não
conseguem apreender ou oferecer uma representação pleno do mistério ou do ser
íntimo de Deus.
Neste sentido, podemos estabelecer uma distinção entre a "Realidade em si", inacessível aos seres humanos, e a "Realidade manifesta", que é vivenciada nas diversas culturas humanas.
Às diversas tradições religiosas e filosóficas
corresponderiam, assim, diferentes respostas à Realidade. A “Realidade em si”
não se enquadra em nenhuma das categorias presentes nas tradições
judaica, cristã, muçulmana, budista ou hindu, nem mesmo em qualquer outra manifestação
da espiritualidade humana. Ela está para além de qualquer de suas manifestações
na consciência humana.
Neste sentido, as afirmações das
diversas tradições religiosas refletem experiências que constituem modos
diferentes pelos quais a Realidade Última atuou sobre a vida humana.
Relativamente à questão da verdade,
urge passar de um paradigma exclusivista para um paradigma pluralista, o que
corresponde a uma verdadeira revolução coperniciana da consciência humana.
O exclusivismo é uma conceção ptolemaica, geocêntrica,
ou seja, um modelo no qual uma determinada religião ou filosofia está no
centro, enquanto todas as outras correntes religiosas e filosóficas se situam em
relação a esse mesmo centro.
Por seu turno, o pluralismo é coperniciano, pode parte
de um modelo no qual o Absoluto ou Deus está no centro, com as diversas
tradições filosóficas e religiosas a girar em torno desse mesmo centro.
A revolução coperniciana que marca a passagem do
exclusivismo para o pluralismo é um grande desafio para a consciência humana.
Talvez seja um dos maiores desafios da História na esfera espiritual, porque
pressupõe uma desconstrução do pensamento humano no seu todo e a concretização
de um novo paradigma.
A adoção de um paradigma pluralista da espiritualidade
coloca a seguinte situação: Como encontrar um caminho que permita aos crentes de uma determinada religião aceitar a
verdade das respetivas outras religiões sem renunciar à verdade da própria
religião e com isso à sua própria identidade?
Considerando que existe uma ética universal comum,
baseada no respeito pela dignidade da pessoa humana, o filósofo e teólogo Hans Küng
analisa as religiões, positiva e negativamente, de acordo com esses padrões
éticos universais.
Com efeito, as diversas conceções religiosas e
filosóficas partilham o princípio de que todo o ser humano, sem distinção idade, sexo, raça, cor, capacidade física
ou intelectual, língua, religião, convicção política, origem nacional ou social
– é dotado de uma dignidade fundamental e intocável.
Positivamente: a religião é boa e verdadeira na
medida em que serve à humanidade, na medida em que, nas suas doutrinas de fé, de
ética, nos seus ritos e instituições, promove a dignidade humana, o sentido e o
sentimento de valor das pessoas.
Negativamente: a religião é falsa e ruim, na medida
em que difunde a desumanidade, na medida em que, em suas doutrinas de fé e
ética, nos seus ritos e suas instituições, restringe as pessoas na sua
identidade humana, na sua busca de sentido, dificultando, assim, uma existência
digna e com sentido.
Todas as experiências históricas demonstram
que não se pode mudar o nosso planeta sem que se chegue a
mudanças de consciência.
Portanto, mais do que nunca, somos
chamados a ser testemunhas ativas desta Regra de Ouro presente e preservada há
milênios nas diversas tradições religiosas, filosóficas e éticas da Humanidade:
faz aos outros o que queres que te
façam também a ti!
Como seres dotados de razão e de
consciência, devemos agir uns para com os outros em espirito de fraternidade,
compaixão e amor.
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