segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

A utopia do coração

O Reino de Deus constitui o eixo central da vivência de Jesus. Com efeito, a sua proclamação constitui o sentido fundamental da sua vida e a utopia referenciadora da sua mensagem, bem como de muitos homens e mulheres ao longo do séculos. 
Contrariamente ao que tem sido preconizado muitas vezes ao longo dos tempos e inclusive nos nossos dias, o Reino não é a promessa da felicidade celestial, mediante a contemplação da essência de Deus para os que cumprem os seus mandamentos e as regras das instituições eclesiais.
O Reino de Deus é a proclamação de uma vida digna, justa e feliz para todos. É um apelo à fraternidade universal. Expressa a manifestação do amor compassivo e infinito de Deus no percurso da Humanidade, visando a constituição de uma ordem social estruturada de modo a assegurar a todas as pessoas a salvaguarda da sua dignidade e do seu direito a uma vida livre e feliz.
Hans Küng assinala que o Reino é a causa de Deus no mundo, que se identifica com a causa do bem-estar total do ser humano. No mesmo sentido, E. Schillebeeckx disse que o Reino é a causa de Deus como causa do Homem ou a causa de seres humanos como causa de Deus (a salvação definitiva da parte de Deus para a Humanidade).
O projeto do Reino de Deus é uma utopia, tendo simultaneamente um caráter histórico e meta histórico, na medida em que não é plenamente realizado na história humana. Como refere J.M. Castillo: ”O projeto do Reino de Deus é realizável na medida em que há grupos de tipo comunitário que se dispõem a vivê-lo, não como una meta já alcançada, mas como um projeto dinâmico, como uma tarefa a realizar paulatina e progressivamente”.
O Reino de Deus é uma afirmação pela vida em as todas as suas dimensões. É uma aposta pela dignidade de todos os seres criados, não apenas dos seres humanos, mas também de todos os seres existentes no nosso planeta e no vasto Universo no qual este está inserido. Para além da sua dimensão social, tem uma dimensão cósmica. Conforme afirma J.J. Tamayo,  “o Reino de Deus afirma a vida indivisível, em todas as suas dimensiones, na sua plenitude, para a natureza e o cosmos. Só assim pode falar-se de vida digna e com sentido” Leonardo.Boff considera que o Reino de Deus é a expressão que designa “a utopia do coração humano, a total libertação de todos os elementos que alienam e estigmatizam este mundo, como sofrimento, dor, fome, injustiça, divisão e morte, não somente para o Homem, mas para toda a Criação.”.
Quando se fala de Criação, é relevante referir que Deus não criou o Universo de uma forma definitiva. A evolução não contraria a ação criadora e criativa de Deus. O Espirito de Deus está dentro do Universo, gerando contínua e evolutivamente os mistérios da vida. Deus é o fundamento da energia criativa do Universo, o princípio e o fim, o alfa e o ómega. Whitehead afirmou que Deus é simultaneamente motor, garantia e meta do Universo.
A pessoa humana é chamada a colaborar ativamente na evolução da Criação, nomeadamente no planeta Terra, não para ser dona e dominadora, mas para ser guardiã da Natureza, tendo a responsabilidade de assegurar a sua proteção e salvaguarda, de modo que os seus recursos possam ser utilizados em prol da dignidade e da felicidade de todos os que habitam o nosso planeta. 

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